A premiere de Xingu aconteceu no Amazonas
Film Festival de 2011. Nela, estavam presentes, dentre outros membros da
equipe, o diretor, Cao Hamburger, o produtor, Fernando Meirelles, e o
protagonista João Miguel.
Depois da subida dos créditos finais, o ator caiu
no choro, o que é justificável. Afinal, seu trabalho magistral, o maior
destaque de um filme cheio de pontos altos, deve ter lhe exigido
dedicação e sacrifício sobre-humanos.
Xingu conta a epopéia dos irmãos
Villas-Bôas. Os intelectuais Orlando (Felipe Camargo), Cláudio (João
Miguel) e Leonardo (Caio Blat) largaram o conforto em São Paulo para se
aventurar pelo vazio do Centro-Oeste brasileiro dos anos 1940.
No decorrer da experiência, eles entram em contato
com diversos povos indígenas e passam a militar pelos seus direitos.
Orlando, o mais velho, lidava com políticos e tecnocratas. Leonardo, o
mais novo, agia por impulsos e por idealizações. Leonardo, líder nato,
era homem de ação.
O resultado do trabalho deles é o Parque Nacional do
Xingu, no Mato Grosso, que completou 50 anos de existência em 2011.
O cinema brasileiro não tem muitas epopeias históricas. Há um Guerra de Canudos
ali e acolá, e só. Xingu contribui para o preenchimento desta lacuna
com competência. A obra resgata e homenageia a trajetória de pessoas
importantes para a causa indígena no Brasil.
A produção da O2 Filmes, de Fernando Meirelles, diretor de Cidade de Deus,
contribuiu para a grandiosidade do tema e das locações da obra; a
logística usada para se filmar no meio do nada e envolvendo tanta gente
deve ter sido digna de Hollywood.
Acima de tudo, vemos uma história bem contada.
Nela, os dramas e os conflitos psicológicos têm tão ou mais importância
que conotações políticas e sociológicas.
Os Villas-Bôas são heróis de carne e osso.
Abnegados, lutam com sinceridade pelos direitos dos ínidios. Mesmo
assim, erram, tem limitações e perdem o controle das emoções em uma
situação extrema.
Caio Blat tem trinta e um anos, mas convence física
e cenicamente como um menino recém-saído da adolescência.
Felipe
Camargo segura as pontas como o irmão mais velho que se preocupa com os
outros e faz o trabalho burocrático que ninguém quer ter.
João Miguel
tem força, entrega, carisma e presença sem iguais. Seu mergulho no
personagem foi profundo a ponto de ele conseguir transmitir um turbilhão
de emoções com apenas uma abaixada de olho.
Se alguém considerava o ator como apenas uma grande promessa graças a Cinema, Aspirinas e Urubus e Estômago, agora, com Xingu, talvez esteja revendo seus conceitos sobre ele.
Cao Hamburger marcou a infância de quem tem vinte e poucos anos com Castelo Rá-Tim-Bum. Além disso, idealizou a série moderninha No Estranho Planeta dos Seres Audiovisuais e dirigiu O Ano Em Que os Meus Pais Saíram de Férias. Assim, com um currículo marcado por obras com crianças e para (ou sobre) o mundo infantil, pode-se dizer que Xingu é o seu trabalho mais adulto e sisudo.
O diretor apresenta de forma orgânica e gradual o
amadurecimento dos personagens. Além disso, aproveita-se das belezas e
da imensidão do ambiente onde o filme passa e lida com os índios e sua
causa de maneira respeitosa. É claro o distanciamento e o estranhamento
dos Villas-Bôas a respeito da cultura indígena, assim como a ausência de
etnocentrismo neles.
As arestas do filme aparecem quando ele perde ritmo
em alguns momentos, como nas sequências com tecnocratas, e em
estilizações na fotografia que não atrapalham, mas não contribuem em
nada para o desenvolvimento da narrativa, como cenas em contraluz.
Apesar disso, a grandiosidade e a qualidade técnica de Xingu não são diminuídas.
A causa indígena-ambientalista está em voga “graças” a conflitos como os da Raposa-Serra do Sol e da construção da hidrelétrica de Belo Monte. Xingu serve como um exemplo positivo deste contexto.
Sua defesa dos direitos dos índios e do meio
ambiente não é ecochata nem subserviente aos poderosos. Aliadas a isso,
suas qualidades técnicas justificam tanta expectativa em relação a ele.
Além disso, Caio Blat, Felipe Camargo e,
principalmente, João Miguel fizeram jus à grandeza dos irmãos
Villas-Bôas com suas atuações.
Graças a filmes como Xingu que mais e mais pessoas mudam o pensamento “filme brasileiro? Que droga”, para o “filme brasileiro? Festa!”.
NOTA: 9,0
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