Mexer com clássicos não é tarefa das mais agradáveis. Ridley Scott deveria saber disso – sua tentativa de reviver o antológico papel de Anthony Hopkins como o psicopata Hannibal Lecter em Hannibal (2001) deixou muito a desejar. Mesmo assim, munido de ambição e voltando a um material que era seu em primeiro lugar – a franquia Alien, que teve seu primeiro e espetacular lance em Alien – O Oitavo Passageiro (1979), de Scott –, ele imagina as origens para a monstruosa criatura que dá nome à saga.
Prometheus instilou nos fãs uma expectativa similar à dos fãs da saga Star Wars, quando George Lucas, o criador da série, anunciou a produção de uma nova trilogia, bem no início da década passada. Tal qual Lucas, Scott infelizmente não conseguiu chegar nem perto do original.
O título do filme explica muita coisa. Prometeu, no mito grego, é o titã que criou a humanidade, mas que, ao roubar dos deuses o segredo do fogo, a fim de presenteá-lo aos humanos, acaba sendo punido por Zeus: é acorrentado a uma rocha, onde uma águia vem todos os dias devorar seu fígado, até o fim dos tempos.
Singelo, não? Brincadeiras à parte, o tema da criação da humanidade, que há muito inspira a ficção científica, é o ponto de partida de Prometheus, bem como as noções de sacrifício e punição do mito original.
Elizabeth Shaw (Noomi Rapace, que foi Lisbeth Salander na versão sueca de Os Homens que Não Amavam as Mulheres) toma o lugar que já foi de Ellen Ripley (Sigourney Weaver) como protagonista da história. Ela e o androide David (Michael Fassbender, de longe a melhor coisa do filme) descobrem indícios de uma super-raça, anterior à humana, e que pode ter sido a sua criadora. Como não podia deixar de ser, eles partem para o planeta dos tais seres, e lá, descobrem que eles deixaram não apenas as sementes da criação, como também as da destruição.
Esse resumo poético, modéstia à parte, na verdade é mais elaborado do que o roteiro em si. É inacreditável como Scott, diante dos diálogos densos e perturbadores de Blade Runner – O Caçador de Androides (1982), ou mesmo da ironia ferina de O Gângster (2007), tenha se contentado com certas falas e situações de Prometheus. Tanto pior quando sabemos que parte delas foi escrita por Damon Lindelof, um dos redatores de Lost, a série mais original e intrigante vista na TV em muito tempo.
A estrutura de Prometheus também desaponta, seguindo bem de perto a do Alien original: a tripulação da nave que dá nome ao filme chega ao planeta, descobre assustadoras ruínas subterrâneas, desperta algo lá embaixo e esse algo vai acabar, um a um, com os personagens do filme. Até o desfecho você já conhece. Esse seria um defeito menor se o recheio do filme fosse mais interessante, com diálogos mais envolventes ou uma ideia nova por trás do conjunto batido. Não é o que acontece.
As situações apenas ecoam outras já vistas em outros filmes da série. Mesmo David, o único elemento original da receita, pega elementos do HAL-9000 de 2001 – Uma Odisseia no Espaço e dos androides existencialistas de Blade Runner. Mesmo assim, empresta vigor ao filme, graças à força da atuação de Fassbender, que compôs um David melífluo, entre o frágil e o ameaçador. Mais um gol para o ator, que vem dando um show em 2012.
Com todos esses defeitos, Prometheus ao menos dá e sobra no virtuosismo da composição visual. Os cenários, bonecos e efeitos especiais desenvolvidos para o filme são impecáveis, explorando com fidelidade a concepção original do ilustrador suíço H. R. Giger. Noomi Rapace também está ótima: ainda que sem o carisma (e a mística) de Weaver, ela defende com garra o papel de Elizabeth, mostrando que pode ter uma bela carreira em Hollywood se continuar com essa disposição. E há sequências que despertam aflição genuína, como a do parto forçado vivido por Elizabeth a uma certa altura da trama.
Mesmo assim, o saldo final de Prometheus é o de um filme apenas competente, risível se comparado ao do clássico que lhe deu origem. Resta a piadinha infame: prometeu, mas não cumpriu.
Nota: 7,0
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