Baseado numa peça teatral que, por sua vez, foi baseada num romance francês, Ligações Perigosas conta a história da Marquise de Mertuil (Glenn Close) e do Vicomte de Valmont (John Malkovich), dois nobres da alta sociedade francesa do século 18 que, apesar da aparência de virtuosos, na verdade vivem para fomentar intrigas e jogos de sedução.
A
vítima da vez das suas maquinações é Madame de Tourvel (Michelle
Pfeiffer), a qual está passando uma temporada na cidade enquanto seu
marido está viajando.
Diretor
veterano e bem-sucedido em seu país de origem, o britânico Stephen
Frears faz aqui a sua estréia no cinema hollywoodiano. E se a primeira
impressão é a que fica, ele não poderia ter feito melhor.
Atento
aos detalhes, Frears ressalta cada canto dos suntuosos castelos e casas
de campo da França pré-revolucionária, bem como os figurinos dos seus
personagens. Assim, ele cria sequências memoráveis e elegantes, como a
cena inicial que traz os dois protagonistas acordando e sendo vestidos
por um batalhão de serviçais.
Tudo isso embalado pela bela trilha sonora instrumental de George Fenton e composições clássicas de Vivaldi, Bach e Handel.
Também
é admirável o elenco que o diretor conseguiu reunir para esta
adaptação: John Malkovich exibe toda a autoconfiança e cinismo de
Valmont, armas que o personagem utiliza para seduzir as suas vítimas;
Michelle Pfeiffer, como a única personagem realmente virtuosa do filme,
evita a armadilha de criar uma mulher chata, ressaltando ao invés disso o
misto de força e fragilidade da Madame de Tourvel; e até mesmo Uma
Thurman aparece em um dos seus primeiros papéis no cinema, interpretando
Cécile de Volange, uma das mulheres seduzidas por Valmont.
No
entanto, o filme pertence mesmo é a Glenn Close, naquela que pode ser
considerada uma das maiores atuações femininas do cinema. A Marquise de
Mertuil é um personagem totalmente amoral e que se revolta pelo fato de
os homens poderem usufruir de uma série de liberdades, incluindo a
própria sexualidade, que são negadas às mulheres. Ela se revolta ainda
mais por ver mulheres castas e aparentemente sem nenhum atributo físico
ou inteligência de destaque serem bem-quistas pelo restante da
sociedade.
Assim,
a Marquise de Mertuil apresenta um comportamento notável perante a
sociedade, apenas para debaixo dos panos poder minar e destruir todos
aqueles que, na sua visão, não merecem ser felizes por estimularem uma
sociedade onde a mulher é submissa. E no seu caminho de vítimas
encontram-se tanto homens como mulheres.
O
poder dos olhares de Close e a forma calculada como ela pronuncia cada
palavra, como se fossem gotas de um veneno letal, são de um primor
poucas vezes visto no cinema, e mostram um verdadeiro animal enjaulado
que luta para se libertar. A sua cena final diante do espelho, por
exemplo, é de tirar o fôlego.
No
final, mesmo que as suas ações sejam bastante questionáveis e não
ajudem muito a “causa”, não se pode negar que estamos diante de uma das
grandes personagens feministas já mostradas no cinema.
Nota: 9,4
Curiosidades:
- Menos de um ano após o bem-sucedido lançamento de Ligações Perigosas, outra produção americana baseada no mesmo livro chegou aos cinemas. O filme Valmont era dirigido por ninguém menos do que Milos Forman (Amadeus, Um Estranho no Ninho) e contava em seu elenco com Annette Benning, Colin Firth e Meg Tilly. O sucesso recente de Ligações Perigosas, no entanto, ofuscou por completo este novo longa. Embora o filme como um todo de fato seja inferior, é preciso destacar a atuação de Annette Bening como a Marquise de Mertuil, um dos melhores trabalhos da sua carreira.
- A história também ganhou uma versão moderna, através do filme adolescente Segundas Intenções, de 1999. Apesar de possuir um interessante roteiro que adapta bem os principais elementos da história para os dias de hoje, o trio de protagonistas (Sarah Michelle Gellar, Ryan Phillipe e Reese Witherspoon) deixa muito a desejar.
- No total, o romance Les Liasons Dangereuses, de Pierre Choderlo de Laclos, já foi adaptado cinco vezes ao cinema, incluindo uma versão francesa (a primeira, em 1959) e uma sul-coreana (a mais recente, de 2003).
- Drew Barrymore e Sarah Jessica Parker foram consideradas para o papel de Cécile de Volanges, o qual acabou ficando nas mãos de Uma Thurman.
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