A Morte (Bengt Ekerot) aproxima-se vestida com um manto preto, e exibindo um rosto branco; logo, joga xadrez à beira da praia com um incrédulo homem (Max von Sydow), cheio de dúvidas. Uma imagem inesquecível para os amantes do cinema.
“O Sétimo Selo” se passa na Idade Média. O roteiro foi baseado na peça Trämålning, de Ingmar Bergman. No enredo, o cavaleiro Antonius Block (Sydow) acaba de voltar das cruzadas (extremamente violentas), daí encontra seu país devastado pela peste, e, por isso, sua fé não é mais a mesma.
Acompanhado de um escudeiro (Gunnar Björnstrand), Block observa o extermínio previsto na Bíblia (inclusive o título do filme foi tirado do livro do Apocalipse), e encontra com a morte em pessoa, que veio igualmente buscá-lo.
Ao se observar a obra de Bergman, nota-se que o diretor inclui muito da sua vida, nos seus filmes. Em “O Sétimo Selo” não é diferente. Quando escreveu o roteiro, ele passava por um momento semelhante ao do personagem central, Block. Estava em depressão por uma crise de fé e pelo medo da morte.
O diretor sempre debateu sobre a existência de Deus e disse, certa vez, que seu interesse era mais intelectual do que emocional. Esta é outra semelhança com Antonius Block, que faz a morte lhe perguntar: - você nunca para de questionar? Como ele diz que não, ela lhe fala que ele nunca se aproximará de uma conclusão.
Em certo momento do filme, Block chega a se queimar, apenas para se aproximar de uma bruxa condenada, e lhe perguntar o que o demônio conhece a respeito de Deus.
Para não morrer imediatamente, Block desafia a morte para um jogo de xadrez, e ela (que tem a certeza de que vai ganhar), aceita sem problemas. É impressionante o efeito que as cenas entre os dois são capazes de fazer com o telespectador.
A morte está de frente para o personagem principal, usando sua inteligência e malícia num jogo, e isso é angustiante e ao mesmo tempo, uma alegoria muito justa da nossa relação com o fim inevitável de todos. Em jogo, não está apenas a vida do cavaleiro, mas também a sua crença em Deus, e em todas as outras coisas.
Por esse forte resultado causado pelas cenas do jogo de xadrez, a sequência já foi repetida, de forma semelhante em vários outros filmes como "A Máscara mortal" (1964), de Roger Corman; “A última noite de Boris Grushenko” (1975), de Woody Allen; “O último grande herói” (1993), de John McTiernan; e “Bill e Ted – Dois loucos no tempo” (1991).
Até em shows, como o da cantora Shakira, a referência ao filme aconteceu. Lá, Bush e Saddam (duas pessoas responsáveis por muitas mortes) jogam xadrez, guiados pela morte.
Parece ser um filme extremamente trágico, talvez triste ou assustador; mas "O Sétimo Selo", ainda que tenha um tema pesado, é um filme divertido em muitos momentos, pois Bergman tinha a preocupação de mostrar a simplicidade da vida e, também, as possíveis agonias que um homem pode ter.
Minha única crítica é que Bergman toca em tantas variações de fé e desesperança que a estrutura dos episódios do filme se torna um tipo de barreira.
Considerados individualmente, os episódios servem como exemplos de como contar uma história econômica e com o máximo impacto visual. Mas como um filme, acaba vagando um pouco dentro de peças criadas, pois ele imerge em uma filosofia oposta à que vem, com o temor ou o humor para corresponder.
Interessante que Ingmar Bergman lançou outra obra-prima em 1957. "Morangos Silvestres" é, entretanto, completamente diferente.
Uma obra delicada e romântica, que fala de forma honesta sobre o sentimento de um senhor que começa a se recordar de amor de sua vida, e chega à conclusões sobre sua mortalidade e frieza.
Os próximos parágrafos contém Spoiler sobre o final do filme:
De frente para o fim de sua própria vida e próximo a ver a destruição geral da praga, o cavaleiro passa algum tempo com José e Maria e seu filho, e diz: “Eu vou lembrar nesta hora de paz. O anoitecer, a taça de morangos selvagens, a tigela de leite, de José com seu alaúde”. Salvar a família de morte torna-se seu último gesto de afirmação.
Sendo um filme de Ingmar Bergman, há a condenação às maldades cometidas pelo homem e às injustiças e hipocrisia da religião, que acontecem muitas vezes. Mas o filme também ressalta o amor, a arte e sua expressão na sociedade, e o encanto das coisas simples.
“O Sétimo Selo” é um filme artístico. A obra é um retrato do valor e da força que as inovações no cinema apresentaram nessa época, em que Hollywood estava em baixa.
A pergunta que permeia o filme é: como fugir ou pelo menos amenizar a terrível certeza do fim? Talvez nem a religião, e nem a alienação nos ajude, segundo Bergman.
Nota: 9.5
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