Pra curar a ressaca do Globo de Ouro, sugiro dois curtas de Jorge Furtado, cineasta brasileiro que teria reconhecimento mundial se fosse americano ou europeu.
Barbosa (1988)
O Maracanaço já foi chamado de a maior tragédia da história brasileira. Se quem não vivenciou a derrota do Brasil diante do Uruguai em pleno Maracanã e nem tem interesse em futebol sente tristeza ao ver aquelas imagens, imagine quem assistiu ao desastre no local. O personagem de Antônio Fagundes viu os gols de Schiaffino e Ghiggia no estádio, e, adulto, inventa uma máquina do tempo para se livrar do trauma de infância. Por tabela, pretende redimir o goleiro Barbosa de uma culpa que não é sua.
Barbosa é uma ideia muito boa. O início feito com imagens de arquivo e áudio da época mostram o clima de ufanismo e já-ganhou antes da partida e depoimentos de Barbosa dão força à história. Mas ela sai prejudicada com incoerências que levam a história pra frente, isso quando não acrescentam nada a ela. Nunca, nem no Brasil de 1950, uma pessoa passaria por um esquema de segurança de final de Copa do Mundo e depois ficaria tão tranquila, sem ninguém querendo lhe expulsar, como o protagonista do curta. Além disso, a câmera dos anos 80 que ele leva para o passado não acrescenta em nada à história (aliás, só um cameraman inútil) e gera incoerências. Assim, como pode ninguém se assustar com um equipamento tão moderno, e como esse mesmo equipamento consegue filmar com a qualidade das melhores câmeras dos anos 50?
O curta mostra ratadas ali e acolá de Furtado antes de amadurecer o seu domínio da linguagem cinematográfica, anos depois. Vale pelo anti-exemplo.
Doze anos depois de Barbosa, o gaúcho dirige uma brincadeira disfarçada de curta.
Sanduíche (2000)
Contar as histórias de Sanduíche estragaria o curta. Pra piorar a situação, o que mais importa é a forma como elas são apresentadas (reparem no início, que é teatral, e no fim, com enquadramentos totalmente diferentes), montadas e interligadas. Sanduíche pode ser comparado a um microscópio que vai saindo do modo de zoom e, no decorrer do processo, vai nos mostrando as ligações dos ingredientes da história, começando no nível, digamos, microscópico e depois se expandindo.
Como acontece com Jogo de Cena, as conversas entre amigos vão ficar acaloradas se forem discutidos os detalhes da forma de Sanduíche. Se bem que a conversa também pode ficar acalorada se alguém falar um spoiler para um amigo que não assistiu ao curta e ficou com raiva de ter tido a surpresa estragada.
Jorge Furtado tem inventividade nos roteiros e domínio da linguagem cinematográfica desde um tempo em que o cinema brasileiro era considerado pobre de ideias e novelizado. Ele errou em algumas produções. Mas sempre fugiu de receitas de bolo que até Hollywood já se cansou.
Tomara que ele faça um novo filme logo, para o bem da nossa cultura.
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