terça-feira, 6 de novembro de 2012

Amazonas Film Festival 2012 - Crítica: Curtas Amazonas de Ficção

Por Caio Pimenta

O Set Ufam avalia os curtas-metragens de ficção do Estado que concorrem no Amazonas Film Festival. As análises são isentas de qualquer tipo de pré-julgamento em relação a qualquer coisa. São levadas em conta as dificuldades que os realizadores enfrentam, não pretendendo-os comparar com filmes de maiores orçamentos mundo afora. As críticas abaixo são referentes às qualidades ou não quanto roteiro, desenvolvimento da história e objetivo alcançado. Não é missão de quem analisa desqualificar A ou B. O papel do crítico não é esse e engana-se quem pensa isso. Nosso papel é sim analisar e contribuir, sempre, para o crescimento e desenvolvimento do cinema, seja onde for, além de oferecer ao espectador um visão além do superficial em relação ao que passa na tela. Boa leitura!

A Segunda Balada

Após vitoriosas participações na Mostra Amazônica do Filme Etnográfico, Rafael Ramos estreia bem no campo da ficção com o drama “A Segunda Balada”. O filme consegue transformar a batida história de triângulo amoroso em uma trama rica e complexa.

O curta traz a história de três amigos que se conhecem há algum tempo, mas que apresentam características opostas: se Rafael (Diego Bauer) é um sujeito burocrata e mais regrado, Tamiris (Ana Paula Costa) e Victor (Efrain Mourão) são mais voltados para as artes e descontraídos. Porém, o que aparentava ser uma amizade juvenil ganha contornos mais sérios quando Rafael se apaixona por Tamiris, enquanto esta começa a se aproximar de Victor, culminando em um trágico fim.

"A Segunda Balada" consegue prender o público no ambiente de tensão que permeia a trama, pois opta pela montagem não-linear, apostando, dessa maneira, mais na construção do tenso relacionamento entre os três personagens do que na questão de “quem fez”.

O roteiro também de Rafael, apesar de não conseguir apresentar bem o universo anterior daqueles personagens (já havia essa tensão sexual entre eles? por que agora tudo isso aconteceu?) e ressaltando até demais alguns pontos já perceptíveis, é feliz em conseguir unir bem todos esses elos e fazer com que, mesmo em 16 minutos, conheçamos um pouco de cada um dos três amigos sem transformá-los em meras caricaturas, muito menos caindo na linha do vilão e herói.

Apesar de Efrain e Ana se esforçarem, é Diego Bauer quem consegue predominar em cena. Com uma atuação mais contida, principalmente no segundo ato da trama, a voz cadenciada e melancólica do ator nos faz ter uma noção daquele sujeito: uma pessoa que precisou perder tudo para conseguir encontrar aquilo que a beleza da vida, mesmo que isso seja tardio e, devida às circunstâncias, desnecessária.

Com uma bela fotografia e trilha sonora de Chopin, “A Segunda Balada” mostra que Rafael Ramos continua no rumo certo e é um dos promissores nomes do cinema local.

NOTA:7,5

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Terra dos Meninos Pelados

Realizado pela experiente cineasta amazonense, Isis Negreiros, “Terra dos Meninos Pelados” (homônimo ao livro de Graciliano Ramos) é um curta dividido em duas partes: a primeira, urbana, é equivocada e desastrada, já a segunda consegue, apesar dos clichês amazônicos, ser mais atraente e salva o filme.

A trama tem como personagem principal Benito Veri (Sérgio Uchoa), sujeito que trabalha em São Paulo e, ao chegar em bar durante conversa com um menino de rua, ele faz uma viagem pelo computador dele até à cidade de Maués, onde várias crianças se divertem.

A teatralidade da primeira parte transforma o filme em um quase desastre. Discursos inflamados sobre virtual e real e o uso da internet (Portal do Paraíso???) dificultam a imersão do público na trama, agravado ainda pelo problema de áudio do filme que faz com que se perceba claramente que os atores foram dublados. Para piorar, há uma falta de cuidado lamentável da produção na cena da banca de jornal: pouco antes de sair do plano, o protagonista se mantém parado de costas para a rua. Com isso, podemos ver o que se passa do lado de fora, o que nos permite ver um ônibus com um símbolo da Prefeitura de Manaus passando ao fundo. Detalhe: pela trama, a cena se passa em São Paulo.

Quando se pensa que tudo está perdido, a segunda parte do filme chega e nos brinda com belas imagens dos mistérios e belezas da Amazônia. Trazendo a ingenuidade e características típicas dos ribeirinhos do interior do Estado, o curta vai conquistando o público aos poucos com a pureza das ações que vemos ali. Isis ressalta ainda mais isso ao deixar a câmera longe dos seus atores (crianças de comunidades da cidade de Maués preparados em uma oficina), deixando-os fazerem o que quiserem. Com isso, o diálogo pretendido pela diretora sobre o virtual e o real ganha ainda mais força pela pureza das imagens captadas.

“Terra dos Meninos Pelados” traz, ao mesmo tempo, o maior mal e riqueza do cinema amazonense: quando quer ser pretensioso, tropeça; já quando é simples, se dá muito melhor.

NOTA:6,0

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Paris dos Trópicos

“Paris dos Trópicos” é, de longe, aquele filme mais fácil de todos os indicados à Mostra Competitiva de Curtas Metragens do Amazonas de Ficção para que as pessoas falem mal. Afinal de contas, é um curta-metragem de animação com gráficos simples (para não dizer, amador) e uma história mais do que bobinha.

Porém, há um elemento esquecido: e o conteúdo, para o que é proposto, serve?

E é justamente aí, a salvação do filme de Keurem Maia Marçal.

O curta mostra o videodiário de Manaus, no qual a cidade aparece falando para o espectador das belezas naturais e artísticas que possui. Porém, a poluição dos igarapés e a falta de conscientização ambiental fazem com que o municio fique “doente” a tal ponto que vá procurar um médico em busca de solução.

Feita de maneira pueril, “Paris dos Trópicos” aposta mesmo em ser um filme para lá de infantil, não foi feito para adultos acompanharem como se faz com os filmes da Pixar, por exemplo, os quais possuem boas sacadas que somente quem é mais velho entende. Não há nada disso e a voz da cidade de Manaus, infantilizada quase que ao extremo, já deixa isso bem claro.

Analisando sobre esta ótica, vejo o filme como um instrumento capaz de passar uma mensagem ambiental que pode ajudar crianças pequenas a, pelo menos, levarem o lixo para o lugar correto dele, já que é curto , possui um roteiro claro e é bem colorido, o que atrai as crianças.

Isso claro não apaga a pobreza estética do filme que poderia ser um pouco mais bem acabado, além da montagem do curta, incapaz de fazer a trilha sonora ter uma continuidade, sempre precisando terminar um trecho para começar o outro.

Que Keurem consiga aliar a mensagem do próximo filme com maior qualidade estética. Porém, merece aplausos pela tentativa.

NOTA:6,5

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ET SET ERA

Com o ponto de partida originado de algo amado por todos os cinéfilos, discutir sobre cinema, “Et Set Era” é uma    divertida comédia dirigida por Emerson Medina e Rod Castro. Apesar dos excessos do roteiro, o curta-metragem consegue levar o público a uma homenagem à sétima arte, além de dar um pequeno puxão de orelha no público local.

Três amigos vão a uma festa de Halloween fantasiados de seus personagens favoritos: Alex (“Laranja Mecânica”), Neo (“Matrix) e Gogo (“Kill Bill). A partir dos ícones do cinema e de surgimento deles, o roteiro já molda a personalidade de cada um e trabalha diálogos que brinquem com o passado e o presente da sétima arte.

A direção de Medina e Castro encontram boas tomadas (a chegada na festa com várias referências a clássicos é de ficar contando quais filmes são as inspirações e brincadeiras) e soluções visuais criativas (o exemplo de como os personagens do Christopher Nolan são estranhos).

É uma pena, porém, que “Et Ser Era” perca o timing cômico na construção das cenas e na montagem ao não aproveitar as boas sacadas citadas acima para criar um filme ágil. Quando o filme pede para possuir diálogos e cortes rápidos, o curta mantém o ritmo de sempre, dando tempo aos personagens para concluir os seus pensamentos, quando o natural, em um caso desses, é o atropelo, uma pessoa falando em cima da outra. Além disso, o roteiro está (feito por Castro) sempre disposto a mais uma piada, o que faz o curta perder o foco, ocasionando momentos fora de contexto e sem a força cômica necessária (a brincadeirinha com “Crepúsculo” e o momento justiceira de Gogo são bons exemplos).

Boa ideia, "Et Ser Era" peca em detalhes da execução, mas, mesmo assim, é um divertido filme para quem curte ou não cinema.

NOTA:7,0

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A Última no Tambor

Um filme de suspense no Amazonas.

Quantos não iriam pensar que se traria de loucura e já colocariam o rótulo de ruim antes mesmo de vê-lo?

Pois não é que este é justamente a grande surpresa do Amazonas Film Festival 2012?

Dirigido por Ricardo Araújo R. D'Albuquerque, o filme acompanha um homem (Breno Castelo, ótimo) que começa a vagar por Manaus aparentemente sem rumo. Ao chegar debaixo de uma ponte e se ver vítima de um assalto, percebemos que o protagonista se trata de um  sujeito perigoso capaz de matar. Em seguida, ainda sem muitas informações, o público o acompanha em direção a um hotel, onde ficamos sabendo que ele tem a missão de matar um empresário local (Lucas Macêdo, caricato, mas na medida para o personagem).

"A Última no Tambor" não pretende trazer algo inovador em termos de narrativa, muito menos foge de comparações com o cinema de Hollywood, visto tolamente como uma espécie de "câncer" por tantas pessoas (muitos deles, aliás, fazem cinema no Brasil e Amazonas). No curta, há muito de Michael Mann e Quentin Tarantino, seja pela fotografia sem grande coloração, transmitindo a sensação de frieza e falta de emoções naqueles personagens, além dos diálogos rápidos e irônicos.

A cena do tiroteio no final do filme já nasce clássica para o cinema amazonense, pois mostra ser possível realizar momentos parecidos com aqueles que vemos nas grandes produções de maneira que não fique tosca. Basta conhecimento das limitações que você tem de produção e usá-las a seu favor.

O filme de Ricardo Araújo traz um novo caminho para o cinema do Estado,  o que já faz o Amazonas Film Festival 2012 ter valido a pena.

NOTA:8,5

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Póstumo

Com o objetivo de fazer uma reflexão sobre o quanto deixamos de viver em troca de miudezas, "Postumo" é um filme correto, mas que poderia ser bem melhor se fosse mais sucinto.

Dirigido por Diego Nogueira, o curta acompanha uma moça (Marianna Sarmanho) e suas divagações e angústias que a levam a um destino trágico.

O curta possui uma ótima fotografia, trabalhando bem filtros que variam de acordo com o tema tratado na reflexão e pensamento da garota, interpretada pela voz suave de Marianna. Além disso, a câmera sempre em constante movimento e perto da protagonista é um acerto de Nogueira, pois, consegue transmitir o mundo de angústia e insegurança da personagem, lembrando, em determinados trechos, "Cisne Negro".

O texto carregado de simbolismo e pouco simples, porém, transforma o filme em algo cansativo, principalmente a partir da terceira parte, como se fosse extensão daquilo que já tínhamos antes.

Salvo pelo alerta que o filme faz no filme, "Póstumo" é um bom curta experimental, mas tinha potencial maior.

NOTA:6,5

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Asfalto

Uma dos vícios do cinema amazonense foi durante muito tempo gravar uma piada e achar que estava se fazendo um filme.

Infelizmente, esse é o caso desse "Asfalto", de Moacyr Massulo.

Desta vez, porém, se troca uma piada pela vingança social em relação a uma contravenção ou irregularidade vista no cotidiano. Aqui, a situação envolve um pedestre e um motorista mal educado.

O resto é possível de deduzir.

Teoricamente, o filme tenta ser uma crítica sobre a incomunicabilidade das pessoas no trânsito. Porém, devido à pobreza da situação exibida na tela, com pouca profundidade, fica sem conseguir nem chegar perto de seu objetivo.

A única coisa que se salva é a trilha sonora de uma das melhores bandas do rock amazonense: Alaidenegão.

NOTA:5,0

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O Tempo Que Volta

Com uma história pouco surpreende e apostando em uma trilha sonora açucarada, "O Tempo Que Volta", dirigido por Abelly Cristyne, consegue na simplicidade conduzir bem os seus quase cinco minutos de duração, mesmo não sendo nada memóravel.

O filme mostra a rotina de um homem vaidoso e galanteador que vive atrás de mulheres, mesmo sem conseguir ser retribuído. O tempo, porém, vai cobrar essa vida aventureira.

Correto em toda sua condução, Abelly Cristyne não arrisca muito na trama e apresenta uma história que, apesar de situações inverossímeis (o sujeito persegue a mulher por toda Praça da Polícia e ela não dá um grito nem fala nada?), passa sua mensagem da forma mais simplificada possível.

Apesar de possuir um final menos convencional, o curta é facilmente esquecido após a exibição.

NOTA:6,0

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Uma Doce Dama

Filmado em 16mm, o curta dirigido por Leonardo José Mancini é, ao mesmo tempo, um experimento cinematográfico claramente sem grandes pretensões artísticas e uma homenagem ao cinema mudo, especialmente ao gênio Charlie Chaplin.

O filme de 2m30 traz a disputa pelo coração da jovem Maria (Mariana Campos) entre Don Fettuccine (o próprio Mancini) e o ex-namorado dela, Vicenzo (Alexander Danielsson).

Simples assim, o curta traz boas atuações de seus protagonista que conseguiram captar bem a essência ingênua da época do cinema mudo, transformando a trama em uma comédia gostosa de se assistir.

NOTA:7,0

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