domingo, 7 de março de 2010

Oscar 2010 – “Distrito 9” (District 9, África do Sul/EUA/Nova Zelândia, 2009)


De uns anos pra cá, o panorama do cinema produzido em Hollywood parece estar mudando. A trilogia O Senhor dos Anéis introduziu novos padrões de excelência aos blockbusters, não só na questão técnica, mas também na visão pessoal e nuançada que o diretor Peter Jackson deu à história. O que parecia um caso isolado foi acrescido de mais indícios: as trilogias Homem-Aranha e X-Men; Sin City; a série Harry Potter; Batman Begins e, o mais importante de todos, O Cavaleiro das Trevas. Sim, os melhores blockbusters passaram a adotar novos tons, com protagonistas divididos, vilões complexos e tramas que incorporam os dilemas das pessoas comuns. Essa virada também valorizou a figura do diretor. Temas pessoais e marcas de estilo, os elementos do chamado “cinema de autor”, estão presentes em muitos dos filmes mais bem-sucedidos e premiados dos últimos anos: O Segredo de Brokeback Mountain, Menina de Ouro, Onde os Fracos Não têm Vez, Quem Quer Ser um Milionário?, Vicky Cristina Barcelona.
Só nessas condições seria feito Distrito 9, na minha opinião, o melhor filme do ano passado. O trabalho de estreia (de estreia!) do diretor sul-africano Neill Blomkamp usa toda a técnica cinematográfica a favor de uma denúncia furiosa da segregação racial. A trama: uma espaçonave gigantesca pára em Johannesburgo, a capital da África do Sul. O governo descobre nela uma população inteira de alienígenas, famintos e à procura de abrigo. Os aliens, chamados pejorativamente de “camarões”, por sua aparência, são colocados em uma favela, que cresce absurdamente em alguns anos, tornando-se um problema. Quando o burocrata Wikus van der Merwe (o excelente Sharlto Copley) é encarregado de “se livrar” dos aliens, levando-os a alojamentos ainda piores numa área afastada, as tensões explodem.
Distrito 9 é rigorosamente a crítica de seu diretor. Sem nenhuma sutileza, o filme apresenta a opressão aos “camarões”, as perseguições, e as retaliações violentas, deles e dos humanos. Trata-se da África do Sul, fraturada por décadas de ódio racial. Mas não só isso. O filme de Blomkamp é uma elegia à tendência humana, como um todo, à violência. A ideia de estruturar o filme como um documentário só acentua essa noção. São situações familiares a todos nós, que presenciamos em décadas de conflitos raciais-religiosos, nos Bálcãs, na Turquia, em Ruanda.
Wikus (Sharlto Copley) e um dos "camarões"

Na técnica, Blomkamp não desperdiça um quadro. Todo o filme é rápido, turbulento, desgovernado, como a própria trajetória do protagonista Wikus. A montagem é excelente, e os efeitos especiais, providenciados pelo já citado Peter Jackson, produtor-executivo do filme, conseguem tornar críveis os “camarões”, de tal modo que não se questiona a “realidade” deles.
O filme foi indicado a quatro Oscars (Melhor Filme, Roteiro Adaptado, Montagem e Efeitos Visuais), o que é animador dentro do cenário duvidoso do cinema atual. Vou torcer muito por este filme hoje à noite, mas torço mais ainda para que Neill Blomkamp nos surpreenda ainda mais nos próximos anos.


Nota: 9.5/10

Renildo Rodrigues, diretor auxiliar e produtor/Set Ufam

2 comentários:

  1. Gostei muito de Distrito 9 porque é uma ficção-científica na definição de um amigão meu: pela sua capacidade de viajar, fala do futuro, ou de outras realidade, e fala no fundo do nosso tempo.

    Apesar de ter sido criticada, partilho com você o gosto pela montagem que o filme apresenta. Gostei, também, da degradação de Wikus.

    Consegui relacionar só agora, com o seu texto, a relação do filme com os "blockbusters autorais".

    Distrito 9 é muito bom, um dos salvadores da lavoura de 2009, mas ele mereceria um 9,5?

    César Nogueira

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