quinta-feira, 9 de junho de 2011

Cult Movies - Grindhouse (2007)

Por Jéssica Santos
Grindhouse é um termo empregado nos Estados Unidos para nomear salas de cinemas de medianas condições, onde, nos anos 60 e 70, eram exibidas produções de baixo orçamento (filmes B) notáveis por cenas de violência e sexo, mas com poucos recursos e efeitos especiais, brechas decorridas dos restritos orçamentos dos seus autores. Na maioria das vezes, sessões duplas ou triplas eram apresentadas, sendo que o espectador pagava o valor de um ingresso, apenas.

Quentin Tarantino (diretor de Pulp Fiction e Kill Bill), fã declarado desse tipo de cinema, era assíduo freqüentador de grindhouses. Surgiu, então, a ideia de realizar um trabalho em parceria com seu amigo, Robert Rodriguez (diretor de Um Drink no Inferno e Sin City). Produziram, assim, dois filmes (À Prova de Morte e Planeta Terror), batizados em conjunto, de Grindhouse.  Foi exibido nos Estados Unidos em sessão dupla, separados por trailers fictícios. Tarantino dirigiu o primeiro e Rodriguez o segundo. Porém, os filmes foram divididos e reeditados para o lançamento no resto do mundo, quebrando o impacto inicial do projeto. O motivo da desunião dos dois filmes que constituíam o pacote original? O fracasso de bilheteira da longa “double-feature”.

 Planeta Terror

Os trabalhos de Rodriguez extrapolam quando o assunto é violência, sangue e cenas bizarras. Exemplos disso são seus filmes O Mariachi, produzido em 1993 com apenas sete mil dólares; e também Um Drink No Inferno, com milhares de vampiros atacando a todos. Essas também são características de Planeta Terror. Numa cidade interiorana do Texas, parte da população é infectada por um gás tóxico utilizado pelo exército dos Estados Unidos no Oriente Médio. O acidente faz com que seus corpos sejam cobertos por feridas pustulentas. Zumbis passam a carregar um olhar vago e a se alimentar de carne humana. 

Cherry Darling (Rose McGowan, de Pânico) uma desiludida go-go-girl, tem parte de sua perna arrancada por um desses seres. Com a ajuda do ex-namorado El Wray (Freddy Rodriguez, da série televisiva A Sete Palmos), que lhe adapta uma poderosa metralhadora como prótese, Cherry liderará um grupo de sobreviventes contra a horda de lacerados.

Sobre esse fato, a atriz teria se perguntado ao ler o roteiro do filme: “como é que alguém pode imaginar em criar um personagem com uma metralhadora no lugar da perna?”. Aceitou logo o papel. Aliás, no filme não se explica como ela puxa o gatilho, mas erros nesse filme são possivelmente propositais.

O filme não tem um roteiro forte. É, na verdade, uma desculpa para que uma enxurrada de personagens estranhos apareça na tela. Como a Dra. Dakota Block (Marley Shelton, de Sin City), uma anestesista que traz em sua cinta-liga uma coleção de agulhas, utilizadas como arma. Ou JT (Jeff Fahey, de Silverado), o dono de uma espelunca que mesmo em meio à selvageria se preocupa o tempo todo em aperfeiçoar a receita de molho para seu churrasco, que ele chama de “o melhor do Texas”. Ou mesmo o Estuprador (Quentin Tarantino, em participação especial), que vai literalmente se decompondo quando tenta violentar a anestesista.

O longa tem ainda a participação de Fergie, da banda Black Eyed Peas. Sua participação é rápida e sangrenta: quando seu carro quebra na estrada errada, é estraçalhada pelos zumbis. Não fique chocado antes de ver o filme. Planeta Terror é exagerado e bizarro mesmo, e até engraçado, afinal, trata-se de um filme trash. Vale a pena ver. Depois de algumas cenas grotescas, você se acostuma! Digo que vale a pena ver por várias razões: a trilha sonora é ótima; os personagens são muito exóticos e bem idealizados, principalmente Cherry Darling, que é muito sexy, com uma metralhadora no lugar da perna! Outro lado positivo são justamente as cenas bizarras, em que você se pergunta: como isso pode estar acontecendo?

 Nota: 8.0



À Prova de Morte

Já Quentin Tarantino... O que dizer sobre ele? Genial. Consegue realizar seus filmes exatamente como idealizou na sua mente, porque tem carta branca para isso. Foi assim que convenceu seu estúdio a bancar "À Prova de Morte" - promoção do gênero "exploitation", um dos mais desprestigiados do cinema. 

Adorador do cinema obscuro, Tarantino sempre venerou filmes de terror, passados numa cidade de interior, com sexo, mulheres perdidas, carros velozes e maníacos assassinos. "À Prova de Morte" é reflexo desse cinema, e ainda bem que o diretor leva suas paixões para a tela, porque elas são sempre transformadas em filmes que saem do óbvio e entram para a galeria de cultuados. 

Tarantino reflete a estética, os temas e até mesmo os defeitos desses filmes. O longa-metragem tem a cor lavada dos filmes B dos anos 1970, erros de continuidade, riscos na imagem, diálogos ridículos e muito sangue. Ambos são mesmo reverência ao estilo grindhouse do cinema.

Jungle Julia (Sydney Tamiia Poitier), a DJ mais sexy de Austin, sai noite adentro pra se divertir com suas duas melhores amigas, chamando a atenção de todos os homens dos bares e boates do Texas. Mas nem toda a atenção é inocente. Cobrindo de perto seus movimentos está Stuntman Mike (Kurt Russell), um rebelde ansioso e temperamental que se oculta atrás do volante do seu carro indestrutível.

A trilha sonora de “À prova de morte” é um espetáculo à parte! E nem tinha como ser diferente! Afinal, Quentin tem um gosto muito bom para músicas, e nesse filme em especial, até emprestou seu jukebox para a cena no bar. Alguns exemplos de músicas imperdíveis: a divertida “Hold tight”, que elas curtem no carro; a sexy “Down in Mexico”, na cena da lap dance; e a irônica “Chick habit” para encerrar o filme são muito boas!

 Se por um lado, o filme não é perfeito porque há diálogos mais longos do que deveriam ser. Por outro lado, nossas conversas na vida real também são banais e não são cronometradas! Tarantino quis apresentar as personagens através desses diálogos; elas falam de acontecimentos banais, de “coisas de garotas”. Também as confabulações são uma homenagem aos anos 70, ao cinema e aos seus amigos (algumas personagens partilham, além do apelido, conversas típicas das suas mais comuns amizades). E quem aguentar seus monótonos bate-papos, verá em seguida perseguições e cenas memoráveis!

Além disso, apesar da grande atuação de Kurt Russel (sempre ótimo), algumas das “vítimas” da história não atuam tão bem assim, mas são salvas pelas características de suas personagens, que são bem diferentes e bem boladas. Elas não têm uma beleza comum e cada uma possui o seu jeitinho, mas no final das contas, são todas mulheres determinadas e poderosas. 

Sem grande esforço, Tarantino conseguiu capturar com êxito o espírito das obras que venera, mesmo considerando que “À Prova de Morte” não chega perto da complexidade estrutural primorosa de “Pulp Fiction”, “Reservoir Dogs” ou “Kill Bill”.

A simplicidade de ambos os filmes é enganosa. Eles retratam com ousadia um tipo de cinema excluído hoje; fazem o retrato de mulheres poderosas, de cidades e pessoas texanas. Para Tarantino, estimulante é quebrar barreiras ainda que o saldo final seja um risco enorme.

Quem gosta do gênero amará o filme e verá cem vezes, quem não gosta, bem, assista também, porque, ao contrário da maioria dos filmes, ele não é previsível.

 Nota: 8.5


O interessante é que apesar de bem diferentes, os dois filmes tem o mesmo estilo, e ainda compartilham alguns personagens! A Dra. Dakota Block e o Sheriff Raique são personagens que aparecem em ambos os filmes. Além de outros atores que também participam dos dois, em papéis distintos. As histórias se passam em cidades próximas e quase simultaneamente.  Grindhouse foi um exercício fascinante de reinvenção de gênero, uma vitrine para duas abordagens radicalmente distintas de ser fazer uma homenagem.

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